Quem
beijava atrás do poste não era eu – nem ela –, assim como a sombra derramada na
calçada não era do mesmo sol que me queimava o rosto. A mão escancarada,
passeando pelo corpo jovem dela, não era a minha: segurava a solidão de um
livro fechado (e não o seio macio). Onde estaria então? Naquele amor atrás do
poste, mais do meu desejo que daquela lascívia? Não seriam minhas as mãos
naquele corpo firme? Não! Onde estou então, me perguntava.
Imaginava
ela naquela boca: era ela! O beijo – as bocas escondidas pelo concreto e pela
sombra, ambas esvaindo-se, febris, alimentadas pelo contato da carne delicada e
úmida – não pertencia a eles: pertencia a mim, a ela. Podia, naquele instante,
no beijo deles, partiturar seus movimentos e pausas; reger grunhidos, moleza,
tomadas de fôlego, arrancadas, mordidas, beliscões, suspiros; contemplar o
rubor em forma de manchas na pele branca e sardenta dela. Sentir seus poros, pelos,
mamilos, nuca de bicho acuado, a calcinha molhada.
O meu corpo vivo no corpo dele roçando-se no
corpo dela, delas, buzinando contra o torpor do dia, estripando o tédio, a
monotonia, as coisas, a rotina. A serpente despertando em mim, movimentando a
folhagem, passeando livre entre os brotos, entrando e saindo dos buracos,
tocas, arapucas escondidas, subindo vergalhões e vigas, arrebentando o reboco
malfeito, perdendo-se, sumindo de vista, deixando a pele fria no silêncio atrás
de si. Fora de mim, do que me pertencia, pulsava em harmonia perfeita com
aqueles corpos.
(...)
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